terça-feira, 5 de agosto de 2014

Câmara de Parauapebas é acusada de ‘torrar’ dinheiro público

Matéria produzida pelo jornalista Ulisses Pompeu para o Jornal Correio, de Marabá, sobre suposto esquema de superfaturamento de notas e desvio de recursos públicos
A Câmara Municipal mais rica da região sudeste do Pará é também a que mais gasta o dinheiro público de forma questionável. Esse questionamento começou a ecoar entre moradores de Parauapebas, a 160 km de Marabá, onde os 15 vereadores vêm sendo incomodados durante o mês de julho com um movimento popular que entregou uma carta-denúncia ao Ministério Público denunciando um suposto esquema de superfaturamento de notas e desvio de recursos públicos.
A reportagem mergulhou nas contas da Câmara de Parauapebas e encontrou, de fato, muitos pontos intrigantes e que merecem explicações por parte dos gestores da CMP. O grande dilema para uma apuração mais acurada esbarra no fato de que os pagamentos efetuados não constam no Portal da Transparência a partir de outubro de 2013. Por isso, apenas os primeiros nove meses de gestão podem ser analisados. Além disso, extratos de licitações publicados no Diário Oficial do Estado em 2013 e 2014 mostram como os vereadores multiplicaram por cinco aditivos de licitações. Os motivos? Ninguém sabe (ainda).
O calcanhar de Aquiles de Câmaras pequenas e de porte médio tem sido os gastos com diárias. Mas, como as contas estão escondidas longe do Portal da Transparência do Legislativo, não há como mensurar se os vereadores estão recebendo muita ou pouca diária em Parauapebas. O campeão, entre janeiro e setembro de 2013, é o presidente Josineto Feitosa. Ele recebeu 30 diárias no valor total de R$ 14.840 no período. Depois, aparecem Devanir Martins, com R$ 12.000,00 e 21 diárias; Israel Pereira Barros, o Miquinha, com R$ 11.800,00 (21 diárias), seguido de perto por Odilon Rocha, com R$ 10.600,00 (18 diárias).
É preciso esclarecer que a diária de um vereador custa R$ 600,00 para cidades mais distantes e R$ 400,00 se vier a Marabá, por exemplo. Por isso, há uma variação entre a quantidade de cada um e os valores correspondentes. Mas, numa Câmara que recebe mais de R$ 3 milhões por mês, é preciso criar despesas inimagináveis para justificar tantos gastos.
Além de pagar diárias, o Legislativo de Parauapebas ainda ostenta o luxo de pagar passagens aéreas e despesas com locomoção para seus nobres vereadores e servidores. Como não há transparência o suficiente até agora – os dados colocados pela CMP no portal na internet dizem respeito apenas aos primeiros nove meses de 2013, e não há nada de 2014 – só podemos acessar os gastos desse período, que chegam a R$ 97.579,02.
Duas empresas fornecem o serviço de passagens para a Câmara de Parauapebas: J.L.P.Santos & Cia Ltda e P.B.Ribeiro e Cia Ltda, que foram contratadas através de um pregão.
Algumas descrições informam corretamente quais foram os beneficiários das passagens, mas há outras um tanto nebulosas, como o pagamento de maior valor: R$ 19.598,23, que descreve apenas o seguinte, com erro de grafia: “Histórico: Serviços de reservas e fornecimento de passagens aérias para atender as necessidades do poder legislativo”. Em outra, usa os nomes dos beneficiários: “passagem aeria de Francisco Solano, Josineto Oliveira, Vicente Silva, Devanir Martins, Bruno Soares, Luiz Sergio Pinheiro”.
A reportagem enviou um questionamento na manhã de segunda-feira (4), com 14 perguntas sobre os gastos da Câmara de Parauapebas, para sua Assessoria de Imprensa, através do site www.parauapebas.leg.br. O que recebemos até o fechamento desta edição foi um email com o seguinte teor: “Devido um problema que tivemos em nosso servidor, somente no período da tarde recebemos seu e-mail e não tivemos tempo hábil para responder a todos os questionamentos”.
“Estamos coletando as informações para poder-lhes passar, mas infelizmente, hoje não será possível, pois são muitas as informações solicitadas e que necessitam de dados de diferentes setores. As informações solicitadas serão úteis em outra data ou somente se fossem repassadas hoje?”.
Em respeito ao direito de resposta, a redação do jornal vai continuar aguardando as informações e manifestações da Câmara de Parauapebas e pretende publicá-las na próxima edição.

Consultorias levam R$ 774 mil da CMP em nove meses
Entre as empresas que se dão bem prestando serviços para a Câmara Municipal de Parauapebas estão a Mel Consultoria e Assessoria SS Ltda e Souza e Seixas Advogados Associados. A primeira prestaria serviços de contabilidade e a segunda seria responsável por assessoria jurídica. Ocorre que o Legislativo de Parauapebas tem sua própria assessoria jurídica e outra contábil, o que, em tese, não careceria contratar serviços externos nestas duas áreas.
Pelo que descreve o site da CMP, a primeira presta assessoria e consultoria contábil, orçamentária, financeira, patrimonial e operacional para cumprimento dos princípios fundamentais de contabilidade do Poder Legislativo. Já a segunda empresa presta assessoria e consultoria jurídica em direito administrativo, financeiro, procedimentos licitatórios e contratos administrativos, elaboração e análise de lei, pareceres jurídicos e defesa dos interesses da Câmara Municipal de Parauapebas junto à justiça comum e Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará.
Entre janeiro e setembro do ano passado, a Câmara de Parauapebas desembolsou a bagatela de R$ 774.050,00 para pagar esses dois escritórios particulares. Sobre essa questão, indagamos a Assessoria de Imprensa da Câmara a motivação dos gastos, haja vista que possui profissionais destas duas áreas em seu quadro de funcionários, os quais já recebem salário para realizar qualquer tipo de serviço e emitir pareceres.

Servidores ficarão obesos com tanta comida comprada
Quanto comem os servidores “gulosos” da Câmara Municipal de Parauapebas e onde a Mesa Diretora estoca tantos “gêneros alimentícios” comprados pela atual gestão? Nos primeiros nove meses de 2013, foram mais de R$ 280 mil em notas pagas para algumas empresas daquele município.
As notas pagas começaram com valores pequenos no início de 2013, como R$ 281,00, mas foram aumentando paulatinamente, até chegar a cifras preocupantes, como R$ 7.945,00, próximo ao limite de R$ 8.000,00 para compra sem licitação. As licitações começaram a aparecer a partir do terceiro mês, com valores altos, sempre com a motivação de “aquisição de gêneros alimentícios para atender as necessidades da Câmara”.
Se as necessidades da Câmara são tão grandes assim para se arvorar no dinheiro público com alimentação, então não se pode deixar de mencionar que os gastos com alimentação no primeiro ano chegam a R$ 280 mil.
A Cavalcante & Aquino Ltda tem um vasto leque de serviços prestados à Câmara de Parauapebas, que vão desde alimentos, passando por impressão de cópias de documentos, material de expediente e processamento de dados.
Mas a fome dos servidores da Câmara de Parauapebas parece que não tem fim. Embora não haja informações no Portal da Transparência em relação ao exercício de 2014, pudemos encontrar no site do Diário Oficial do Estado várias licitações publicadas pela CMP, algumas delas exclusivamente para o fornecimento de “gêneros alimentícios”.
Em um deles, com vigência entre 9 de abril e 31 de dezembro de 2014, a Câmara publicou dois extratos de contrato com a empresa D.Ferreira Melo Cavalcante no valor de R$ 348.218,40 para “aquisição de gêneros alimentícios estocáveis e não estocáveis para atender a Câmara Municipal de Parauapebas”. Todas as licitações são assinadas pelo presidente da Câmara, Josineto Feitosa de Oliveira, na qualidade de ordenador de despesas.
Outro extrato de contrato encontrado no Diário Oficial foi formalizado com a empresa J.Reis Vieira no valor de R$ 101.699,80, também com vigência entre 9 de abril e 31 de dezembro de 2014. Por ele, a Câmara se compromete em pagar por “aquisição de gêneros alimentícios estocáveis e não estocáveis para atender a Câmara Municipal de Parauapebas”.
Foi um desses contratos que resultou em um documento assinado por alguns moradores de Parauapebas que foram parar no Ministério Público. Ele não contém indícios de irregularidades, mas apontam para caminhos que podem estar recheados de superfaturamento, como é o caso de compras com a empresa D.Ferreira Melo Cavalcante, popularmente conhecida em Parauapebas como Supermercado Baratão.
Também precisam ser esclarecidos os contratos para aquisição de tantos materiais de expediente para atender às necessidades da Câmara. Os contratos publicados no Diário Oficial e as notas pagas deveriam ser analisadas com cuidado pelas autoridades fiscalizadoras.

Josineto faz aditivos 5 vezes maiores que o valor da licitação
O presidente da Câmara de Parauapebas, Josineto Feitosa, precisa explicar por que fez aditivos de contratos com empresas de Parauapebas com valores cinco vezes maiores que o que constava na licitação ganha por elas.
Por exemplo, o extrato resumido do aditivo ao Contrato nº 20130010 informa que a contratada V.C.dos Santos – Restaurante ME – deve oferecer serviços de fornecimento de buffet, coquetel e café da manhã para atender à Câmara Municipal, e “o presente termo aditivo objetiva a alteração contratual no valor de R$ 54.485,45, passando o contrato a ter valor total de R$ 272.427,25.
Em outro extrato aditivo ao Contrato nº 20130030 de licitação, a empresa Gráfica Bahia Ltda ganhou licitação no valor de R$ 19.976,90, mas conquistou graciosamente um aditivo, amplificando o contrato para o valor de R$ 99.884,50.
Em outro contrato, nº 20130015, a empresa J.Reis Vieira também foi beneficiada com um aditivo para aquisição de gêneros alimentícios. O contrato inicial era para R$ 39.933,48 e ganhou um fermento para R$ 199.876,48.
O contrato nº 20130031 com a empresa Sacramento & Cia Ltda para contratação de serviços gráficos tinha valor de R$ 18.012,75 e foi catapultado para R$ 90.063,75, mais de cinco vezes o valor inicial.
O mesmo ocorreu com a empresa J.L.P.Santos & Cia Ltda para fornecer serviços de reservas e fornecimento de passagens aéreas para atender às necessidade do Poder Legislativo de Parauapebas. O contrato inicial era de R$ 47.850,00 e surgiu na internet posteriormente com o valor de R$ 239.250,00 através de um voo supersônico.
Mas há um caso intrigante de contratação de uma empresa para com inexigibilidade de licitação. Trata-se do Instituto de Direito Público do Pará, contratado a peso de ouro: R$ 130.000,00 para ministrar “curso sobre patrimônio público” para os servidores da Câmara Municipal.
Os especialistas consultados pelo jornal dizem desconhecer a instituição. “É preciso saber se ele tem notória especialização e o serviço que prestou é singular, isto é, se outras entidades semelhantes não poderiam efetuar o mesmo serviço. Logo, devendo haver licitação para contratar esta entidade; pelo que vi, é uma entidade desconhecida, jamais tinha ouvido falar; é preciso pesquisar onde fica, quem são os proprietários e se o curso era mesmo necessário e se foi realizado”.
Segundo o mesmo especialista, chama a atenção os seguintes pontos que devem ser melhor verificados:
1. A data das alterações dos contratos parecem ser as mesmas; o fundamento jurídico é o mesmo para todos os aditivos; eles ultrapassam o valor de 25% estipulado para esse tipo de prorrogação contratual, para serviços ou compras, conforme o parágrafo 1º do artigo 65 da Lei nº 8.666/93, citado nos extratos; o fundamento legal previsto no inciso I, letra "b", do referido artigo, que admite a prorrogação contratual somente quando tem como necessária a alteração contratual "em decorrência de acréscimos ou diminuição quantitativa de seu objeto", ou seja: aumentou-se a aquisição de passagens, refeições, serviços de gráficas e outros, assim de uma vez só, numa mesma época?; “Seria necessário ter acesso aos autos e a motivação integral, já que essa variação do preço deve estar relacionada com o aumento do objeto; mesmo assim, com o limite de até 25% do valor inicial do contrato; qual a razão para estes aumentos: alteração do preço de custo dos serviços? Todos de uma só vez? Realmente ultrapassaram em muito o valor do percentual de 25% para serviços, o que deixa a necessidade de ser investigados estes aditivos.
Por último, o especialista diz que caso essa situação seja irregular, pode proporcionar enriquecimento ilícito ou mesmo frustração do processo licitatório que pode levar para repercussão na esfera penal, artigo 92 da Lei nº 8.666/93, para o responsável. Logo, se para aditivar os contratos até os 25% já há que ter causa justificada, então acima desse percentual surgem indícios de improbidade administrativa; e o cálculo do percentual tem que ser em cima do valor original do contrato prorrogado.

Denúncias apontam para caixa dois
Matéria veiculada em blogs e sites de Parauapebas no início do mês de junho.
Os vereadores Odilon Rocha (SDD) e Irmã Luzinete (PV), de Parauapebas, estão sendo acusados de pressionar o comerciante Edmar, o popular “Boi de Ouro”, proprietário do Supermercado Baratão, a pagar propina por meio de nota superfaturada da Câmara Municipal.
De acordo com a denúncia, os parlamentares teriam chegado no início da noite de quinta-feira (5 de junho) ao escritório do Supermercado Baratão, na Rua A, esquina com a Rua 4, e Luzinete passou a ameaçar o proprietário do estabelecimento, que estava no andar de cima, dizendo para um funcionário que o comerciante não era homem, enquanto Odilon pedia para ela se acalmar.
Segundo informou a testemunha à reportagem, o supermercado fornece alimento para a Câmara Municipal e tinha uns veículos locados para aquela repartição pública. As caminhonetes eram locadas por mais de R$ 1 milhão.
A testemunha afirma que a vereadora chegou pedindo dinheiro a mais da nota que a Câmara paga para o supermercado. No momento, o proprietário do estabelecimento se encontrava no andar superior do prédio, onde reside.
A fonte do supermercado acrescentou que durante o contrato de locação dos veículos a presidência da Câmara exigia importância a mais do contrato, o tal caixa dois. O contrato de locação dos veículos foi encerrado dia 6 deste de junho, mas o fornecimento de alimento continua.
O funcionário do supermercado disse estranhar por que a presidência da Casa passou o caso da comissão para os vereadores Luzinete e Odilon tratar com Edmar.
Outro lado
Procurada pela reportagem na manhã do dia 9 de junho, a vereadora Irmã Luzinete, a princípio, negou que tivesse visitado o estabelecimento comercial. “Não estive lá e nem conheço esse empresário. Não participo de nenhum esquema de corrupção da Câmara. Eu represento Deus aqui na terra”, sustentou.
Com a insistência do repórter, dizendo que testemunha tinha visto ela no supermercado, na companhia do vereador Odilon, a vereadora confessou que esteve lá, sim, para fazer companhia ao colega de parlamento, que, segundo Luzinete, empresta dinheiro a juros para o dono do supermercado e ele foi lá receber parcelas atrasadas, “mas nada a ver com a Câmara”.
Ouvido também pela reportagem, o vereador Odilon Rocha contou uma versão diferente, dizendo que chegou ao escritório do supermercado e encontrou a vereadora Luzinete muito aborrecida, mostrando-se bastante exaltada, querendo falar com o dono do supermercado. “Pedi pra ela se acalmar, afirmando que aquilo não era um bom procedimento, mas não tomei conhecimento do assunto que a colega queria tratar com o comerciante”, revelou Odilon Rocha, acrescentando que em seguida deixou o local e a vereadora teria ficado lá.
Sobre o assunto, o vereador Josineto Feitosa (SDD), presidente da Câmara Municipal, confirmou que o Poder Legislativo tinha dois vínculos de prestação de serviços com a empresa de Edmar Boi de Ouro, sendo um de locação de veículos, que encerrou em 6 de junho, e o outro referente fornecimento de gêneros alimentícios. Este último, no valor de mais de R$ 200 mil por ano.
“Desconheço os motivos que levaram os vereadores Odilon e Luzinete a ir tratar deste assunto naquele supermercado. Desconheço também qualquer tipo de superfaturamento de nota. Vou entrar em contato com o empresário para eu tomar ciência do que está ocorrendo e depois chamar os vereadores que teriam ido lá”, informou Josineto Feitosa.
Procurado para falar sobre o assunto, o empresário Edmar Boi de Ouro não confirmou e nem desmentiu as acusações, preferindo não tecer nenhum comentário sobre o tema.

MP instaura procedimento investigatório
O promotor Paulo Sérgio da Cunha Morgado Júnior, de Parauapebas, explica que no dia 17 de julho recebeu uma representação no Ministério Público por alguns populares. E levou um teor um pouco vago sobre a suposta fraude no fornecimento de gêneros alimentícios na Câmara dos Vereadores, assim como na locação de veículos da Câmara. Diante disso, uma cópia ficou com a 4ª Promotoria de Justiça, para apurar a responsabilidade civil e a improbidade administrativa, e uma via foi para a 1ª Promotoria Criminal, a qual ele responde.
Nesta última, ele instaurou um (Procedimento Investigatório Criminal) similar ao inquérito policial, que dá os primeiros passos para uma investigação. “A representação está vaga, então, é necessário colhermos elementos, instruir os procedimentos para verificar se ocorreu, ou não, fraude, superfaturamento de notas, assim como desvio de dinheiro público”.

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