segunda-feira, 15 de julho de 2013

O Governo do PT e as rádios comunitárias: 10 anos de solidão (parte 1)

Por Dioclécio Luz (assessor parlamentar na Câmara dos Deputados, Brasília, julho 2013)
O objetivo deste artigo é fazer um registro do que ocorreu no período de uma década com relação às rádios comunitárias no Brasil, quando o governo federal esteve sob o comando do Partido dos Trabalhadores (PT). Analisam-se as ações do Executivo (o governo estritamente falando) e suas relações com o Legislativo e as representações da sociedade civil.
Marco zero: o início do fim
O presidente Lula assumiu em janeiro de 2003, quando já estava em vigor a Lei 9.612/98, que regulamenta as rádios comunitárias (RC). A legislação incorpora ainda o Decreto 2.615/98 e a Norma Técnica 01/11.
Nesses dez anos de poder, o Governo PT, que podia alterar toda legislação, somente mudou a Norma Técnica - e para pior. Ao mesmo tempo deu mais poderes à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), antes criticada veementemente pelo PT. Logo ao assumir, o Governo PT ampliou a repressão às emissoras não autorizadas, algo que o partido também criticava antes. A título de exemplo, em 2005 (dois anos de PT) foram fechadas 1.086 emissoras de rádio que funcionavam sem autorização. Isso equivale à média de 90/mês ou 3/dia. No ano seguinte, a Anatel foi mais eficiente ainda, atingindo a média de 95/mês. Uma média que tem crescido ano a ano.
É preciso deixar bem claro que, ao lidar com as rádios comunitárias, o Partido dos Trabalhadores tem adotado uma posição ideológica de direita. O pior é que faz isso camuflado como aliado das RCs, como se estivesse atuando com elas. O governo rebate as críticas acusando os críticos de estarem numa “disputa política”. Diz ainda que essa crítica está a serviço da “direita”, como se este governo agisse pela “esquerda”. Ocorre que esta postura de avestruz oculta um mundo real demarcado claramente por uma linha ideológica de direita; uma linha que segrega e exclui quem faz rádios comunitárias.
A bem da verdade, não se pode generalizar: nem todos os petistas instalados no governo agiram contra as RCs. Tanto no Executivo quanto no Legislativo, petistas mantiveram sua coerência defendendo as rádios comunitárias. A questão é que estes não têm poder para definir e implantar uma política para o setor. Fez isto o núcleo majoritário do PT no governo: camuflando-se para se passar por aliado, reproduzindo um falso discurso democrático para justificar os abusos.
Mas como o Governo PT sustentou essa farsa por dez anos? Por que só uns poucos revelaram que havia uma farsa, uma engabelação? Uma das respostas está na utopia: acreditou-se que o PT, sendo guardião da utopia da esquerda, faria as mudanças pretendidas para o setor. Esta é uma visão romântica (e messiânica) que o partido explora, manipulando “a esperança do povo”.
Todavia, isso ainda não é o bastante para explicar como “tantos foram enganados por tanto tempo”, aceitando promessas de que algo jamais seria feito pelas rádios comunitárias. Ocorre que o Governo PT fez uso de expedientes que pareciam apontar para o debate democrático no setor. Um deles é o discurso em defesa da “democracia na comunicação”; outro, o uso de práticas que sugerem uma “construção coletiva”, ou um “processo coletivo e democrático” – termos caros aos utópicos defensores do setor.
Por exemplo, se o processo democrático, como se sabe, inclui a abertura de “diálogo com a sociedade”, os dirigentes, autoridades, técnicos agora participam de eventos, debates e reuniões. Ocorre que não resultam em nada... O governo também abre “consultas públicas” - para rejeitar tudo que representa mudança positiva; cria Grupos de Trabalho - para descartar as propostas que não lhe agradam; abafa as reivindicações com promessas que não se cumprem. Quando este governo é questionado por que não modifica a legislação, ele responde com três clichês: 1) “Esta é a legislação possível”; 2) “Esta é a mudança possível”; 3) Somente o Legislativo pode fazer isso. As três opções se constituem em meias verdades.
É claro que o PT poderia ter feito muito mais. Em dez anos de poder, salvo as exceções de praxe (servidores e técnicos que continuam atuando em defesa das RCs), o Governo do Partido dos Trabalhadores enganou, ludibriou, enrolou os que fazem rádios comunitárias. E é dessa engabelação política – uma mentira na história - que se fala aqui. (Continua)

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